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A palavra

 

Foto: José Lorvão

 

O vocábulo estouvado caiu no charco mais profundo

Sendo devorado pelas estalagmites da negra caverna

Para onde se converteu na ausência de tudo

Sem melodia e parceiros que o fizesse dançar

Incapaz de se prolongar em êxtase até à imensidão da galáxia

Bloqueado por criaturas sugadoras ávidas pelo seu desmembramento

Enterrando-o num portal incerto no delírio inacabado do tempo

 

Os homens serviram-se da palavra para açambarcarem

O planeta mais lindo do sistema solar

Como parasitas foram invadidos por outros de diferente estirpe

E por entre plásticos e enlatados assassinaram os cetáceos os peixes

Os mamíferos terrestres e tudo quanto tinha o nome de vida

Enlouquecendo na xenofobia e nos ódios incontidos

Nos encéfalos em vias de implosão desaparecendo em esqueletos polidos

 

Criatura estranha esta que não voa nos sinónimos

Destruindo-lhes a magia cortando-lhes as sinfonias acopladas às sílabas

Que as decompõem em lâminas finas lambidas pelas línguas venenosas

Sangrando cuspidelas de viroses traiçoeiras e assombrosas

As palavras já não se sentem deixaram-se de ouvir

Vomitadas através das gargantas inflamadas pela distorção do mundo

Os velhos amordaçados extinguem-se calados

E o testemunho é um poço vazio sem sentido e sem brio

 

O verbo tornado visível na cantilena de amor sem atritos

Deflagrou-se em autofagia pela renovação eterna das danças placentárias

Escondendo-se em manicómios azarados de lagartos linguarudos

Ansiando ser encontrado em lugares incógnitos provocadores de mitos!

Poços escorregadios onde deslizam mapas de localização de nados

Alvoradas intempestivas de olhos esbugalhados procurando sustento

Libertinagens cortantes fedendo a promiscuidade sem predileção

Amamentações de canídeos cruzando uivos pela seleção natural

Vírus inteligentes à solta nos espaços contíguos à decadência

Raivas pecaminosas controladoras de cérebros em decomposição

Agitações cardíacas transformadas em pó na síncope temporal

 

 

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