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Máscaras de dor

 

Foto: José Lorvão

 As mãos vibram como prolongamentos de um corpo insaciado

Mondam as ervas que teimosamente atapetam o solo húmido 

Das chuvas tristonhas de início de Outono

Enquanto os humanos acariciam o medo sem glória nem trono

 

Em agachamento as pernas procuram o equilíbrio

Sobre o odor das raízes das ervas daninhas

Fixando segredos da vida na profundidade da escuridão 

As costas dobram-se em vénia como que adorando o solo

E sob o sol e o calor do estio contaminador de suores

A dor sobrevém contorcionista exposta num trapézio instável

Dissolvendo o rosto irreconhecível nesta movimentação

 

O semblante dilui-se na secura abafada dos dias

Enquanto a respiração acelerada

No esforço de cavar a terra desmaiada pelo abandono

Lado a lado com a mudez humilhada

Em sonoridades múltiplas criando renovadas vastezas

Rebelando-se a criatura contra a escravatura disfarçada

 

A máscara permanece apertada contra o nariz

Escorrendo fios de alergias na explosão fúngica

Em campos minados de incertezas  

Nas zonas quebradiças por onde as gavinhas se enrolam

Num emaranhado controlador de forças e durezas 

 

Não nos reduzimos unicamente à solidão

Que nos premeia com perspetivas únicas navegáveis

Somos metamorfoses em ascensão e declínio 

Planamos em coreografias de luzências

Escorrendo fios de sangue implacáveis

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