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A mostrar mensagens de novembro, 2020

A energia da salamandra

    Um ser de pele luzente fixa-se no tronco mais antigo Arrasta-se pelo musgo estabelecendo-se na textura Na cor e rudeza dos contornos dos cantos e recantos das fissuras Procurando nas saliências o famigerado refúgio Escondendo-se nas rachas por entre os fungos no mofo das negruras   Provocador de convulsões tem este animal no âmago a dissimulação A toxina que impulsiona a pressão sanguínea dos indesejados Que afasta do seu caminho colocando-os em fuga por hiperventilação   Observa o fraquejar dos elementos lançando uma fina rede de suborno E na projeção da língua espalhafatosa atrai as moscas mosquitos Aranhas e outros seres movediços hipnotizados e facilmente engolidos Todos servem para lhe encher as entranhas até os vermes da mesma espécie Desde que permaneça no seu poleiro linda e sedosa como uma rosa   A lambisgoia disfarça-se e balança-se Ora se agita ora se ostenta aflita Preparo o salto para longe deste pesadelo acordado Ah salamandra

A lapa do mar e a rocha

    Num tempo fugidio em que as algas flutuantes desaparecem da praia E sofrem arrastamento para a incógnita do alto mar Uma lapa entre as lapas decide aventurar o seu pouso E um procedimento de sobrevivência arriscar   A lapa fogosa entusiasta e matreira ataca outras lapas Requer para si todo o protagonismo E carente de aplausos e estímulos Baba-se perante as vénias da restante fauna marítima Emite caretas para todos os lados em subtil ameaça Até a lula é seduzida pela minúscula forma gelatinosa Escondida sob a casca dura sem graça   Agarra-se à rocha mais perto pois que a força das marés É traiçoeira e pode arrastar embarcações estilhaçando-lhe o costado Murmura-lhe elogios e afaga-lhe o ego Convencida que a rocha será sempre o seu porto de abrigo Beija-a de forma suculenta Abraça-a com a viscosidade de um reptil Defendendo os ovos prontos a eclodir   Este existir é de luas incertas perante o chuvisco entremeado De um oxigénio pelo magm

Cenário rotativos

    Estou perante um palco instável apodrecido pela força das marés sem intelecto Bato palmas oscilo e dou largas ao brado esganiçado batendo sempre nas mesmas lengalengas O pano clínico que me aprisiona o nariz e a boca impede-me de pensar o futuro com determinação Agora tudo fica periclitante assistindo à decomposição dos sistemas Nada é o que aparenta ser Somos temporariamente donos de um líquido ácido que nos escorre pelas mãos A doxa impera em todos os cantos como se fosse a imperatriz dos versículos absolutos Só me resta mudar de estrado pois que a impotência em consertar madeira que range sob os meus pés tornou-se desastrosa As paredes que sustêm o cenário estão prestes a desabar e o soterramento é repetição de tragédia pesarosa   Há palcos rotativos! Mudemos de cenário! O desejo de fuga daqui para ali ou talvez uma pirueta atlética dentro do meu ser Que me expanda a visão e me dê meios de deteção de parasitas gabarolas Ginastas contorcionistas mala

Ruídos e tagarelices

    Limpo os ruídos as lamechices as tagarelices os lambe-botas Excluo também os bolos sem açúcar os queques destilados a sangue frio E os convencidos que a opinião é rainha na terra dos mudos e surdos Viro costas a quem sorrateiramente me despreza só porque sim Talvez o meu olhar intimide o silêncio agrida a gargalhada confunda   O meu cansaço é oriundo da constatação da inutilidade do discurso pobre Da pressa com que se esbofeteia o outro só para se suster mais tempo No tronco da árvore mais elevado como macacos em folia desenfreada   A minha neura provém da ligeireza das falas Quando as sílabas oscilam sem nada dizer Do esquecimento da musicalidade verbal Do inverter a marcha andar de costas às cegas E assim mesmo um som audível é vomitado no compasso da azia plural E entra a dança maluca que acelera almas e corações Pulos de gafanhoto e voos de borboleta vestida de veludo colorido Apenas numa fração de segundo o júbilo do ser ignorando multidõe

A intimidade dos anjos

  Já não há tempo nem espaço para lançar o grito sem que estourem galáxias Porque a ausência melódica mina a troca efetuosa de olhares Perante uma concentração hipnótica egoísta e estagnada Num sobe e desce enlouquecida presa ao chão e à cruz pregada Enfeitada de cordas em nós cegos que dilaceram os desejos De esquartilhar o fruto da anunciação pelos ensejos de luz Numa pontaria suspensa em balizas desgastadas e transitórias Ao desvendar esconderijos de parasitas sugadores de gastas memórias   Há uma praia gigante de sonhos adiados onde não há voos de gaivotas Apenas um crematório à espreita na correria da multidão eleita E a direção que se toma em piloto automático no rolar da estrada Adia só por breves segundos o travão na cadência sem controle da desfeita Brotando uma indiferença florida pelo capricho do ego em dança quebrada   Em modo de rumo às estrelas mesmo sem um centavo Agitam-se promessas de fama num castelo esfarelado Correm as ratazanas sob