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Desnorteamento

 


Perdi a hora!

Ergo-me da cama pela madrugada pensando serem horas de ir trabalhar

Levanto-me e o ritual de saída de casa é feito sem pensar

Alguém me informa - o que fazes? São cinco da manhã!

 

Caio em mim admitindo a desorientação

O que andamos nós a fazer uns aos outros?

O que estou a fazer a mim própria?

Um vírus camaleão que nos assola há anos e permanece

E uma guerra provocada por monstro mal-amado

Que bane do vocabulário empatia e dignidade

 

A tosse viscosa pega-se a tudo e todos

Como verme de ventosas colado à máscara

A respiração ofegante anuncia a patologia instalada

E mal o sol desponta há um ser humano a gritar sozinho

No centro da rua revoltado contra tudo e todos

 

É o meu espelho!

Estou muito perto dele!

Os gritos de indignação e denúncia

Permanecem acoplados ao coração agitado

E o sonho da noite sacudiu as vozes gerando desabafos

Ergueu os braços contra a incúria ignorante

Caráter   pequenez e egoísmo que maltrata e arrasa

E por insistência sádica massacrando mata

 

Inevitável esta mágoa instalada

A frieza e indiferença com que me presenteiam

Endurece os gestos de quem perceciona o carrasco

Mesmo disfarçado de subtilezas

Escondendo venenos que nos provocam asco

 

O poder tem milhões de rostos

E nesta movimentação eterna em passagem

Vibra uma movimentação impercetível

Como doce e amarga aragem

 

Não sou!

O que resta de mim é apenas um florescimento num planeta distante

Pequena flor anunciando outras espécies

Relembro! Serei filha da alvorada

Vim ao mundo num choro convulsivo de criatura revoltada

Deslizei da escuridão para a luz pelas três da madrugada

Num esforço gigante

O regresso da luz para a escuridão será consagrado

Acontecimento profano e merecido de um peso finalmente aliviado  

 

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