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Gotas de suor

 


Foto: José Lorvão


 

Procuro a sombra tingida de salvação com os pulmões exaustos

Fugindo do braseiro porque o sol se revolta e perfura-me os ossos 

Transformando-os em areia crepitante corroendo-me por dentro

Empurrando-me e aprisionando-me na campânula do tempo

Ampulheta hipnótica escorregadia numa dança invertida

Aprumada com o núcleo terrestre e de movimento esfaimada

Ignorando desfasamentos e demónios inspirados em lugares sangrentos

Enquanto o embalo do berço adoça a alma e a faz dependente do sono

Do ritmo enganador da engrenagem topológica do abandono

 

 Gotas de suor gelado humidificam o rosto da criatura à minha imagem

Que se esvai perante a tontura provocada pela brisa abafada

Só pode ser o vento lento soprando da serra ocioso  

Que me sussurra ao ouvido o local secreto da passagem

E invadindo-me desarvorado na ondulação vertiginosa do mar

Incute-me a vontade que pede o repouso em sigilo suplicante

São as profundezas das águas que anulam os estalidos do corpo revoltado

Com os grilhões de pesar indefinido nas órbitas oculares

Olhar fatigado de cenários bélicos orgias pestilentas

Quais cascavéis enroladas sem saber onde estão as cabeças

E as caudas em viscosidades entrelaçadas

Entre o choro e o silêncio o grito espalha-se pelos maxilares selados

Com os teóricos a escorregarem nas teses dos afortunados

E a alienarem impúdicos os desagregados

 

Por entre tamanha podridão liberto-me da palavra

Para mergulhar apenas na melodia que nas estrelas se lavra

Imiscuir-me no som das cascatas na sonoridade dos pássaros em voo

Mas a náusea agita-se algures nas entranhas e não desaparece

Anunciando o  declínio na visão inquietante da mulher 

Desistindo do amor qual veneno que engulo a custo

E que anula a mais suprema vontade de viver

Voltando a fadiga petrificada num corpo avisando da queda

Sobre arame farpado ditador de fronteiras

Semelhante a esgotos a céu aberto alimento de ávidas feras

E os fios de náilon asfixiando as criaturas dos oceanos

E o vómito prestes a desabar sobre os astuciosos ladrões de lares e terras

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