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A vibração dos gatos

 

Foto: José Lorvão


Aproximam-se os felinos permanecendo serenos ao meu lado

Mas estão alerta porque a minha energia mudou

Agora encontro o limite do desencanto no quarto escuro

O labirinto sem saída

E o gato abre os olhos apesar de fingir que dorme

Enquanto a siamesa vira o focinho para mim em interrogação

 - Que se passa? É tão grande o teu sofrer que te apagas da geografia do mundo?

- Não!  - Respondo-lhe. – Apenas quero misturar-me nas flores e nas árvores

Nos mares e nos rios nos vulcões e nas nuvens!

 

A gata siamesa foge para fora do quarto

Deve pensar que enlouqueci perdi o juízo, sumi!

Só o inocente gato comum da europa pachorrento e amarelento

Me faz companhia nesta desfeita da vida

Talvez por ignorância preguiça ou compaixão!

Será que os animais têm comiseração?

Sinto que sim!

Quando estivermos mais perto dos animais teremos alcançado

Um patamar na escada da evolução!

 

A siamesa é mais esperta e sensível!

O humano entranhou-se no pêlo e no batimento cardíaco

O gato comum europeu quer paz e dormir em cama de humanos

Amedronta-se com os ruídos mais naturais do exterior

Só o instinto de abocanhar os pássaros é incontrolável

 

Queria ser pássaro!

Sonho que voo sem contratempos

Prendo-me nos tetos sem dificuldades e elevo-me no ar

Como se voar fizesse parte da minha natureza

Como é que um sonho pode durar uma vida inteira?

Sonhar que se voa, que se plana sobre os campos, os rios e os mares!

Ah este corpo prisioneiro em direção à decadência

Ansiando a passagem de testemunho a olhos cegos e ouvidos moucos!

 

Que raio de existência é esta que parece apenas parte de um fio

Que se prolonga indefinidamente no entrançado das direções

Cada gesto, cada escolha fica gravada

Mas os que estão perto compreenderão a mensagem?

Sentirão o empenho e o sacrifício?

Morrerei!

Em pó me transformarei!

Em energia cósmica ressuscitarei!

Mas o aqui e agora é cortante, sangrento, doloroso

E na indiferença dos humanos me dissolverei!

 

 

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