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A extinção dos vaga-lumes

  

Desapareceram da floresta os pirilampos

Nem pelos caminhos agrestes nem nos silvados assomam

Agora só as máscaras flutuantes sobre o nada se cumprimentam

Escondendo carpidos adornando desapontamentos

Rasgando espaços onde mães esquecem os filhos em frações de tempos

Injetando estupefacientes hipnóticos segregados pela recreação da avareza

Que escraviza progenitores rebentando-lhes com a vontade

 

Erguem-se esquadrões de fuzilamento disfarçados de benfeitores

Dissemina-se no corpo um sangramento ininterrupto

Um ácido corrosivo que ateia por dentro

E baralha as palavras em acasalamento frenético

Facultando intimações do poder embrutecido

No bulício dos milheirais transgénicos

Imbuídos de um fascismo contaminado de cérebros sádicos

Imbecis alheios à decadência ambiental

Em que vive o exército anulador de inimigos

Criados nas suas próprias veias

Genocídios arquitetados nas próprias teias

 

Agora os melros e as poupas dejetam sobre os bancos dos jardins desertos

À espera das risadas das crianças

Já não voam os pirilampos nas noites quentes de verão

Eleitos pelo ostracismo das alucinações que alimentam

Guerrilhas de loucura temperadas com sal

Em feridas abertas nas múltiplas possibilidades do incremento do mal

 

A solidão senta-se à mesa e petisca o alimento feito à pressa

Na vertigem cruel e seca do cansaço

Os músculos sofrem cãibras dolorosas e prolongadas

Como se a carne se desprendesse dos ossos por querer autónomo

E as bocas deixaram de beijar pois o desejo ocultou-se

Nas reentrâncias da apatia e desligamento como se de mortos-vivos se tratasse

Os amantes perderam-se no receio da contaminação e alhearam-se

Pelas noites de ausência e pelos dias volteando em  mecânico carrocel 

Subindo e descendo apenas evitando na comida o sabor amargo do fel

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