Avançar para o conteúdo principal

Esfregaços


 

Esgravato um tempo de cores suaves entre pinceladas abauladas

Numa tela curva que reata o fim e o princípio qual carrocel

Que volteia na feira animada de residências assombradas

De templos despidos de paredes outrora caiadas

Apenas conservando as doces e frescas fachadas com odor a mel

 

Desfaço-me em esfregaços informes de cor púrpura

E ignoro tenazmente o sofrimento agudo que me invade o peito

A estranheza que se aglutinou a mim em laivos delirantes

Não sei se me afasta das intempéries incontroláveis do mundo aflito

Ou se me retalha e empurra para a miscelânea insubmissa

Que compõe o distorcido cosmo em espasmos contagiantes

 

Tranquei-me por dentro neste tempo obscuro de embaraço

E empreendo a fuga para um mundo quântico num voo picado

Que se repete no infinito tentando ultrapassar o portal do esquecimento 

Contorno os caminhos migratórios das acrobacias fantasiosas

Retorno ao grupo de crianças traquinas que nos ribeiros chapinham

Colho os lírios nos campos onde pequenas avionetas aterram

Como andorinhas livres e felizes sob o azul celeste

Agitam sensíveis asas em arrebatadas manobras deleitosas

Indubitavelmente estou irrequieta transbordando alegria no meio delas

E acompanho extasiada o seu adejo dançante que no céu desenham


Comentários

Mensagens populares deste blogue

A sobreposição das cordas

Foto: José Lorvão O olhar surpreende a chuva para lá do portal húmido da vidraça Enquanto o estômago é enganado no engodo vertiginoso De uma simples carcaça Os dias repetem os ecos os risos os choros os gritos os abraços e os sorrisos Mas a memória elimina conteúdos de tóxicos recheios Em sobreposição das cordas que serviram para enforcamento E que no agora se transformam em oportunidades de recreio Caminho dentro de roupagens ensopadas e escalo palcos De horizontes em metamorfose inebriantes inalcançáveis sedutores Os sentidos fundem-se com explosões e colapsos Embaraços e desembaraços piruetas e saltos à vara E o corpo de que sou feita prega-me partidas rindo da incredulidade Como se por encantamento ou feitiço me considerasse ave rara Neste atalho por onde deslizo sopro apenas como vento sem norte Uma gota de água derramada no abismo do oceano onde me esvaio e mergulho O resto excedente de uma planície que serve de alimento às bestas A

Inverno tenebroso

  Abraço o corpo enfraquecido pela turbulência dos lodaçais Que agoniza perante as chuvas que se evaporam em solos de mordaças e temporais Refugiando-se a mente num submundo sem escravatura Fervilhando a revolta perante a indiferença e chacota dos demais   O isolamento contorna cada curva do feminino Entontecido pelas cavalgaduras sem rosto Capta sementes de destruição Torrentes agressivas de desilusão E os sorrisos transformam-se em rasgos de bocas Onde dentes sem mácula se preparam para triturar e engolir as presas   A sofreguidão de mimos e bajulações é tanta que se escarra Para cima de quem se mantém afastado da mímica De adoração de mafarricos à solta Batendo asas como loucos mesmo sem poderem voar     Neste inverno as nuvens pousaram em campos contaminados Em pulmões doentes expostos ao inquinamento das viroses Em hepatites devoradoras de órgãos contaminados por sugadores de sangue Proliferaram nas chicotadas psicológicas da loucura No

Resistir

  Foto: José Lorvão A minha própria voz soa-me a desgaste Não sou eu! Apenas um molde das marés Um retrocesso mascarado num “déjà-vu” Embrenhei-me no fluído de imprecisão ondulatório E deixei-me conduzir pela corrente magnética Controladora de pânico por entre o enredo sufocante Num ambulatório cortante e desconcertado A caneta apresenta-se agora nestes dias de ausências Arremesso pesado estranho e ignorado   O azul claro do céu temporário tornou-se por instantes o meu alimento E as árvores! Sempre as árvores companheiras de partilha De trilhos sonoridades e gustações atenuando as dores do inferno Perante a dança ininterrupta dos pássaros E o sol que me aquece e aconchega neste final de novembro Põe a descoberto igualmente toda a beleza e fealdade No retorno ameaçador da pandemia com a invasão do Inverno   A mãe natureza assume a zanga e provoca ameaçadora Tempestades e inundações, explosões vulcânicas Lembrando ao convencido que tem controlo