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Assombramento



 
Foto: José Lorvão

Escavo sulcos na própria pele por entre rasgos que se dão à luz das criaturas virais
Quando em ansiedade mutilo as unhas e olho embasbacada para as palmas das mãos
Tentando encontrar no seu traçado a linguagem dos tesouros escondidos
Mapas de ligação a tornados e veredas que apontam para campos de lírios ancestrais

Mas o lodo entra em efusão e borbulha na caverna austera
Lugar dissolvido nas visões dos répteis guardadores de rebanhos cósmicos
Suspensos em cordas de tensões elásticas
Enrolando-se em piruetas gigantes que sopram em gozo sublime
Expandindo e encolhendo bolas de sabão criadoras de mundos pontes em ligação
Enlaçando as moléculas e as viroses em constantes adaptações
No revelar espinhoso das manobras das contradições

Entroncamentos que me guiam os passos por entre terrenos minados
Onde os parasitas esposam as posturas por inteiro
E descubro no recanto a ponte de pedra por onde a menina saltita a caminho da escola
E as diabruras por entre risotas atravessando o ribeiro

De nada tenho saudade neste respirar pesado
Nem dos tombos nem das feridas nem das precocidades
Da criança que rodopia sem preconceitos na descoberta da mata por explorar
Nem das neuras nem dos choros nem das fantasias
Nem das danças nem das melodias
Nem da perceção da distância nem das dificuldades de adultos
Contaminando vapores sombreados nas nuvens densas
Nem dos tijolos nem das vigas nem das pás nem do cimento
Nem do frio cortando os dedos nas manhãs geladas
Por caminhos de terra batida húmida enlameada aqui e além
E assim perco-me e encontro-me nos trilhos e no questionamento
E na modorra abandonada dos sem vintém
O confrontar do perfeito paradoxo de alguém que desfez o corpo 
Construindo uma casa e casa não tem!

Agito-me em fermentação nos túneis e reentrâncias da revelação
Onde brotam incontrolados os fungos e germinam flores negras
As redes de sustentação servem de balancé às cópulas gigantescas
Das galáxias onde me embrulho em deflagração iminente
Enquanto os drenos trabalham incansáveis na sugação dos dejetos
aspirando o pó das estrelas
Provocando os fluídos delirantes de um dinamismo eternamente presente

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